Visita a Fábrica de Varas de Fly nos EUA. 100% feito a mão.

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Thiago Zanetti FSB
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Visita a Fábrica de Varas de Fly nos EUA. 100% feito a mão.

Mensagem por Thiago Zanetti FSB » Ter Mar 13, 2012 12:56 pm

Esta foi uma visita que fiz a fábrica da marca Scott, da qual Fly Shop Brasil é distribuidor no Brasil.
São varas feitas 100% a mão, por pessoas que pescam, e são apaixonadas pelo que fazem.


Montrose, CO. 1
E o Embraer sobrevoa as montanhas rochosas, faz uma curva e pousa em Montrose, Colorado, uma cidade de 30 mil habitantes.
Nesta cidade fica a fábrica e escritório das varas Scott.
Cheguei no lugar e de imediato ao entrar já senti o mesmo cheiro de quando se tira a tampa de uma vara novinha, e em um lapso imensurável de tempo entre a porta e a recepcionista, o cheiro me fez lembrar da minha Scott favorita, uma G # 6 de 7 pés em 3 partes, e recordar as matrinxãs - este modelo foi desenhado com a ajuda de Lee Wulff.
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A recepcionista me encaminha ao escritório do meu amigo Ian. Um cara muito gente fina que fala pacaramba. Depois na sala ao lado encontrei-me com o presidente da Scott, Jim Bartschi.

Eles pediram um tempinho para terminar de responder alguns e-mails para então prosiarmos.

Após nossa conversa a portas fechadas - incluindo a recontagem e tréplicas sobre histórias de pescaria - Ian me leva por um tour no galpão. E o que contou, mostrou e explicou fez uma reviravolta em minhas crençcas e ao mesmo tempo um carimbo de confirmação de ideias que há tempos fermentavam. Algo parecido ocorreu quando vi Chico Fernandez arremessar de perto ou quando o Flip Pallot depois de ficar 45 longos segundos me observando arremessar e depois com uma frase na sua voz rouca dizer "tente assim.." .
Ideias esparsas e perdidas que não achavam suporte ou feedback para conversa, não havia encontrado nas outras fábricas quem falasse essa língua.

IAN: -Bem, você sabe como uma vara é feita não é?
THIAGO: -Sim, enrola o grafite no mandrel, tira, corta, passadores, etc..
(loira gata passa perto, me distraio).
IAN:-Ótimo, então vamos falar sobre varas de pesca de um ângulo diferente.

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E ao invés de contar superficialmente como uma vara é feita, nós pulamos este passo e fomos direto para o âmago da empresa e seu estilo de produzir artesanalmente uma a uma varas de pesca com mosca.




Montrose, CO. 2
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Só quero saber a verdadeira verdade. Uma linha de pensamento.

Entramos na salinha de corte e enrolamento dos lisos (blanks).
TODO O MARKETING É BALELA.
WOW !
A premissa é que "todas" as varas de pesca são feitas com o mesmo material - grafite. Algumas tem boron, outras tem fibra de vidro, e agora as bolinhas mágicas de nano tecnologia. Mas não existe capacidade financeira na indústria da pesca com mosca para que uma empresa financie estudos no nível do Pentágono ou de um time de cientistas Phd para produzirem uma resina para varas de pesca com mosca !
As bolinhas do Sintrix foram ofertadas para todas as empresas de varas e somente algumas se dedicaram a usar. Agindo como advogado do Diablo, então se é tão milagrosa, por que todas não lutaram pelo material ? Se o Boron é tão excelente, por que todas não usam ?
A Verdade é que não existe milagre, sinto informar, mas é meu dever. Não é uma vara com uma resina de tecnologia "aero-espacial" que vai fazer seu arremesso mais perfeito. Como já escrito, na essência todas varas são feitas do mesmo bom e velho grafite (~ fibra de vidro). Mais módulos, menos módulos, IM6, IM8, B-delta-tango-charlie, tecnologia 9, ... ... Senhores, isso é marketing de cada empresa para se diferenciar entras as outras e criar e sustentar sua identidade. Estranho, quem vive de e para isso jogar estas palavras, mas é assim.

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Então o que faz uma vara diferente da outra?

Ian continuou explicando que uma vara muito rígida com paredes finas é muito frágil, o oposto, muito pesada, se puxar uma conexão entre partes pra cima, fica pesado pra baixo, são infinitias variáveis. Uma vara é como um carro de fórmula 1. Você já deve ter visto que nos cockpits eles sempre estão ajustando uma asa, colocando mais pressão, tirando pressão do pneu, ajeitando, ajustando, tudo é em equilíbrio cinético, se mudar aqui muda lá que requer uma mudança de outro lado! Assim é a construção de uma vara de fly.
Então as empresas estão sempre buscando este equilíbrio com vista no que a vara se dedicará, água salgada flats ou água salgada mangue ou água doce flotada ou água doce wadeo. Lembra da experiência da G2 durante as flotadas na Patagonia algumas semanas atrás? A vara funcionou, pesquei, mas poderia ter um percentual de produtividade um pouco maior se tivesse pescando com uma S4 que é mais rápida e me permitiriria tirar e colocar a isca na mesma velocidade que o barco descia. Cada vara equilibrada para uma situação.
Por isso que não tem uma vara Universal faz tudo. Está ok ter várias e várias varas, uma pra robalo, uma pra robalo no fundo, uma pra tucuna, uma pra bass, uma pra truta, uma pra traíra.. O que a Scott prega - além da ideia de que não existe fórmula secreta e material da Nasa - é que cada vara tem seu lugar e aplicação.

Geralmente o mosqueiro inicia pescando com uma vara e então com o passar dos anos vai ampliando seus conhecimentos, expertise e feeling e exigindo essas configurações em varas diferentes, por isso também que a Scott não é uma vara para total iniciante, mas para quem já está andando sozinho.

Seguindo a conversa e com os lisos já cortados em suas partes (3, 4, etc) saem da sala de enrolação na máquina para a primeira inspeção, ali é o primeiro motivo por que as Scott são mais caras.


Todas as outras marcas lixam e pintam seus blanks, a Scott só trabalha com o blank ao natural, sem pintura. Vendo uma vara de Montrose de perto e passando o dedo pelo blank é possível enxergar e sentir as voltas que a manta de grafite deu. Este é o acabamento natural. Os lisos não são pintados ou lixados por que: 1 a lixa gasta de uma vara para outra, de uma vara para outra ela já não é a mesma. 2 a pressão que o montador aplica de uma vara para outra muda sempre 3 a pressão que uma pessoa faz é diferente do que outra pessoa faz.

Na primeira inspeção eles procuram falhas nas voltas de grafite e descartam os falhados. Outras empresas passariam o blank numa boa - especialmente as feitas na Ásia.
Ok, talvez seja quase impossível sentir essa diferença, segundo Ian, eles tem umas 40 pessoas que usam protótipos nos EUA e dão feedback antes de lançar uma vara, entre os 40 apenas 12 realmente conseguem sentir e detalhar "ei, este blank está diferente deste por isso isso e isso". Sensibilidade artística.

OBS- Não estou pregando a falta de qualidade de outras marcas, mas relatando fatos do que acontece e no ponto de vista que me foi explicado e entendi. E se você refletir um pouco, é verdade.




Passa uma tinta ? Não, joga fora.

Talvez não se sinta diferença de uma vara para outra apenas por um detalhe como o acima, é na soma dos detalhes que se faz uma vara que produz o tipo de arremesso e pescaria que se deseja para o que ela foi projetada.


Montrose, CO. 3
Seguindo a conversa.
Depois da primeira inspeção dos blanks (lisos) me foi explicado os dois tipos de conexão que utilizam. A de Ferrule Interno e a Ferrule Que Cobre - Ferrule Manga.- FQC (numa tradução tosca).

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A FQC é a mais comum em praticamente todas as marcas de varas, por que é simples de fazer, corta os dois pontos nos lisos e une. A Ferrule Interno é outra história, é necessário montar outra seção de grafite, e testar as medidas no pedaço de liso no qual irá ser colado por dentro. Coloca dentro do blank, testa, não deu - ficou grande ou ficou curto - tira corta testa novamente, e isso leva mais tempo e mais dedicação e no final maior custo para a fábrica.

http://www.youtube.com/watch?v=rreAwA8s ... r_embedded


A diferença entre um e outro é:
FQC - este sistema cria um intervalo (linha vermelha desenhada nas fotos abaixo) entre a continuação do diâmetro do blank, causando uma reta de rigidez. Os diâmetros do blank só se igualam e continuarão o afunilamento natural alguns centimetros após a conexão em si. Esse sistema é utilizado nas varas mais rápidas e principalmente nas de água salgada.



Ferrule Interno - o diâmetro do afunilamento não sofre um gap grande deixando o blank com ação suave ou quando precisa diminuir a rigidez do blank. Utilizado nas G2, F2, WarmWater, BC Special, G, e outras.


SEGUNDA-FEIRA, 9 DE MAIO DE 2011

Montrose, CO. 4
Então fomos para a montagem.
Prende a cortiça do grip e são colados os passadores. Os passadores das S4S são os melhores que se pode comprar. Se for comprar um passador (guia) custa U$65 nos EUA. São em titânio. Os passadores das S4S são Recoil, daqueles que não amassam e voltam a posição original e também é impossível que o sal do mar corroa estes passadores.


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Então é fixado o reel seat (aonde prende a carretilha). Mais um detalhe. A inspeção das madeiras elimina um bocado dos reel seat que eles recebem, são tipos de madeiras - que eu não lembro o nome - dos mais caros, exclusivos e difíceis de conseguir. Os em alumínio das S4S recebem o tratamento parecido com as carretilhas Lamson (Hard Alox) acabamento rígido que impede riscos. Mantendo a beleza do equipamento por muitos anos.


Depois de fixada a cortiça o reel seat e os passadores a vara vai para as mãos da moça que escreve no blank o modelo da vara, o número de série e a logo da Scott, com uma caneta estilo tinteiro. Muito bonito de ver. Segue o filme. (Os modelos que saem mais levam a logo e descrição estampados, só o número de série que é pintado a mão).


antes de relatar a viagem.. Montrose, CO. 5
Depois da aplicação de resina sobre a logo e descrição a vara vai para secagem numa sala com máquinas que giram "rodas" para prender as varas que ficam.... girando.
Então secas tem mais uma inspeção de qualidade, varas com pequenos defeitos são descartadas ou voltam para arrumar.



E finalmente a vara é posta na meia protetora e vai para o estoque.

Ao ser pedida, o número de série é anotado na tampa do tubo e no sistema de informações e para qual loja está sendo enviada.
Uma senhora simpática embala tudo com carinho - parece uma avó embrulhando o presente de natal pro netinho - o caminhão da UPS para no portão e as varas vão para o mundo inteiro.

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Depois de ver todo esse trabalho que dá desenhar, produzir, embalar e enviar, e finalmente receber aqui no Brasil uma vara dessas, o tipo de cuidado que passei a tomar com elas mudou completamente. De um certo desleixo - a fim de testar também a resistência - para total cuidado.
Varas são feitas para pescar, não para bater em vira-lata caribenho atiçado que quer morder minha perna. E agora durante esta pescaria de bonefish no flat, com a cabeça bem focada em detectar o trabalho do equipamento senti bem a diferença que uma vara artesanal e equilibrada, com uma linha dentro dos padrões AFTMA (Cortland) faz. Uma linha que escorrega pela sua própria capacidade de ser casteada e pela técnica de arremesso com a vara, diferente de linhas pesadas para seu número que fazem a vara trabalhar na marra.


O vento maldoso não dava chance e o guia pior ainda só sabe contar acima de 18.
-Bonefyss dicinueve metros ala esquierda. Ves?
-Si.
E o vento vinnha da... esquerda. Parecia o Congresso Nacional.

Mas com um pouco de técnica, abaixando o corpo e o loop bem rente a água conseguia colocar a mosca aonde ele cantava.
Muy bien, dexe que hunde.. strip.. strip..
ZIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIII.. ZIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIII (carretilha cantando).
Desde a prateleira do estoque até este momento, poucos sonhos que não o da fotografia com um belo peixe desses empunhando uma vara de verdade se passam.

http://i82.photobucket.com/albums/j242/ ... b9e61b.jpg


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Minha mãe foi uma artista plástica pintora, cresci no seu atelier de pintura e lembro de suas paletas de cores enquanto pintava suas telas, a arte pura de sensibilidade. Se posso resumir toda a Ideologia Scott em uma palavra é Artesanal e se em uma imagem é a abaixo, a paleta de cores para pintar os pontos de alinhamento das seções.
Obrigado a todos da Scott por terem recebido a FSB. Nos vemos na água.

Imagem[/img]
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Beto Akamine
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Mensagem por Beto Akamine » Ter Mar 13, 2012 2:32 pm

Fantástico, Thiago! Um dos melhores posts/relatos que já li aqui!
Merece ser fixado sem a menor sombra de dúvida.
Relato de quem pesca (muito), dedica-se (muito), estuda (muito) e ama (muito mesmo) essa cachaça doida chamada flyfishing..

Muitos se perguntam porque uma vara made in China e uma made in USA ou made in Japan tem tanta diferença de preço, sendo que os componentes são muito parecidos, a tecnologia empregada é quase igual. A diferença é: trabalho humano e controle de qualidade. Trabalho especializado é caro, caríssimo! Muitos fazem, poucos fazem bem, alguns poucos fazem excepcionalmente bem. Controle de qualidade é custo de produção. Quanto maior o controle, maior o custo, porque o descarte é muito grande, a mão-de-obra empregada para inspecionar e revisar o material é muito grande. É à prova de erros? Não! Mas o risco de se ter problemas é infinitamente menor.

Depois de gastar 12 milhos de pacote, viajar 3 dias, chegar na beira do rio e não conseguir pescar porque a vara solta do encaixe, os passadores estão frouxos, o reel seat não segura a carretilha.. não dá, né?!

Continue postando seus relatos. Viajei contigo.

Abraços

Beto Akamine
"Rezar como se tudo dependesse de Deus e agir como se tudo dependesse de nós"
(São Inácio de Loyola)

Caterva Jurássica - velhos pescadores velhos
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José Ferreira
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Mensagem por José Ferreira » Qua Mar 14, 2012 7:51 pm

Muito Bom.
VLW :shock: :shock:
Recicle, Preserve e Principalmente Pesque e Solte : Assim Não Vai Faltar
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Law Huei
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Mensagem por Law Huei » Qua Mar 14, 2012 9:05 pm

Post maravilhoso, me senti na fábrica contigo !! Material top, e relato top. Parabens e obrigado por compartilhar.
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Luiz Almeida
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Mensagem por Luiz Almeida » Sex Mar 16, 2012 10:58 pm

CARACA THIAGO!

FAÇO MINHAS AS PALAVRAS DO BETO AKAMINE E, MAIS AINDA, É UM DEVER CÍVICO SEU POSTAR ESSE TÓPICO NOS DEMAIS FÓRUNS DE PESCA COM MOSCA DOS QUAIS VOCÊ PARTICIPA!

AINDA REPORTANDO ÀS OBSERVAÇOES DO BETO, TEM UM POST MEU, PERDIDO EM ALGUM LUGAR DOS FÓRUNS (INCLUSIVE CATERVA) ONDE DESCREVO A MESMA SENSAÇAO EM RELAÇÃO À G-LOOMIS. ENQUANTO O BOSS ERA O MR. GARY.

ISSO É PESCA COM MOSCA, É ARTE E É O QUE FAZ TODA A DIFERENÇA!!!!

GRANDE ABRAÇO

Tio Luiz
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Sidnei Dorea
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Mensagem por Sidnei Dorea » Sex Mar 23, 2012 8:58 pm

Tiago,

Eu gostei da descrição detalhada, não entendi tudo ( :shock: ), mas adorei ver as fotos e o processo de fabricação das varas. É um trabalho artesanal de primeira. A gente acaba valorizando o trabalho.

Parabéns pelo post e viagem.
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Leandro Bianchi
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Mensagem por Leandro Bianchi » Qua Abr 25, 2012 11:30 am

amigo usted hace rod spey cast, ???? gracias a su respuesta
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