SISTEMAS DE TRANSPOSIÇÃO DE PEIXES - I

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jckruel
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SISTEMAS DE TRANSPOSIÇÃO DE PEIXES - I

Mensagem por jckruel » Sáb Jun 28, 2008 10:38 am

Caros companheiros do Caterva,


Era minha intenção continuar postando argumentos/trabalhos/posicionamentos sobre mecanismos de transposição, estou de volta na tentativa de melhor esclarecer este tão polêmico assunto.

Antes de mais nada, é conveniente esclarecer que este tópico visa dar o posicionamento do mais importante pesquisador sobre mecanismos de transposição (Dr. Sidney Martins -USP) e serve de contraponto às posições do Prof. Agostinho -UEM -PR, postadas no tópico armadilhas ecológicas, postado pelo Nelson.

Antigamente a discussão ocorria em função de que os empreendedores alegavam que, dada a altura dos barramentos não era viável a construção de mecanismos de transposição e por isso, os órgãos licenciadores nada exigiam... (Até porque isso costuma ser caro e os entes licenciadores não podiam onerar o setor elétrico).

Para início dos debates, volto a colocar aqui parte da argumentação que coloquei na inicial da ACP contra a facilitação no licenciamento da UHE Serra da Mesa:

“DOS DANOS CAUSADOS PELA NÃO TRANSPOSIÇÃO DOS PEIXES NA BARRAGEM.

Breve histórico.

Os sistemas para a transposição de peixes são projetos multidisciplinares, pois envolvem as ciências da engenharia, biologia, ecologia e meio ambiente.

Nos últimos trinta anos, não foram construídos todos os sistemas de transposição imprescindíveis à natureza nos barramentos, em primeiro lugar porque os órgãos licenciadores, de forma negligente, deixam de exigir o cumprimento da lei.

Em segundo lugar, porque tal procedimento desonerava os empreendedores e provocava uma mísera redução de custo nas obras em detrimento à conservação da vida!

Por último, eram produzidos estudos superficiais deficientes em qualificação técnica, deixando de cumprir o mínimo necessário - biólogos sem concepção estrutural, engenheiros sem preparo biológico e ambiental, além da falta sistemática e endêmica de dados básicos: (velocidade dos peixes, inventário da riqueza das espécies, rotas de migração, ambientes reprodutivos, migração trófica, necessidades ambientais, capacidade física, volume e preferências dos cardumes.

Felizmente, foram e estão sendo construídos barramentos que atendem a necessidade de perpetuar a vida, pois parece que nem todos os empreendedores são desprovidos de sensibilidade no cumprimento de exigências legais.

Por outro lado, infelizmente, ainda são produzidos estudos de impacto ambiental (EIA) para desobrigar os empreendedores da implantação de mecanismos de transposição, como ocorreu nesses dois últimos séculos, sem o menor amparo ético e moral”.
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Pois bem, isso eu coloquei há seis anos atrás, de forma que muita coisa mudou e a tendência é que todos nós tenhamos que evoluir, na medida em que novas informações são anexadas ao processo.

Temos assim, o que os até então intransponíveis obstáculos foram superados pela nossa engenharia e os peixes, enfim, puderam subir... Vejam que não estou falando de escadas... Falamos de mecanismos de transposição! Qualquer um que possa funcionar a contento!

Aí entra na discussão o canal de transposição de Itaipú, que eu saiba parece que há peixes descendo e está ocorrendo (não sei em que escala) a migração trófica!

Também existem escadas que funcionam perfeitamente e peixes que sobem e descem tais mecanismos, parecendo, então, que existem alternativas técnicas, tanto que o Biólogo de Itaipu que acompanhou tudo desde o início, foi cedido temporariamente para FURNAS fazer o canal de transposição do Madeira...

Nos parágrafos acima, espero ter deixado claro o posicionamento pessoal com relação aos mecanismos de transposição!

Nos parágrafos abaixo, selecionei de forma muito resumida o que acreditei ser um dos melhores trabalhos já realizados por um dos grandes pesquisadores sobre o assunto, que o país possui: Dr. Sidney Lazaro Martins -USP

É uma versão bastante abreviada (correndo o risco de ter cortado algo importante, mas muito profundo) da dissertação de mestrado apresentada pelo Dr. Sidney sob orientação do Prof. Eng. Dr. Kikuo Tamada:


“Sistemas para a Transposição de Peixes”, em 27/06/00, na EPUSP.


MECANISMOS DE TRANSPOSIÇÃO - I

Boletim Técnico da Escola Politécnica da USP
Departamento de Engenharia Hidráulica e Sanitária
SISTEMAS PARA A TRANSPOSIÇÃO DE PEIXES
Sidney Lazaro Martins
Kikuo Tamada
São Paulo – 2000


RESUMO

Sistemas para a Transposição de Peixes são implantados para atenuar os efeitos negativos dos barramentos sobre os peixes migradores ou de piracema.

No Brasil, como na maioria dos países subdesenvolvidos, devido a fatores históricos, financeiros, políticos, constitucionais e culturais desfavoráveis, há uma defasagem tecnológica quanto aos

Sistemas para a Transposição de Peixes, STP’s, pelo menos secular, com consequências imensuráveis ao ambiente e ao universo dos peixes.

A importância dos nossos peixes fluviais, onde se destacam os migradores como os de maior interesse comercial e esportivo, é indiscutível. Assim, esta dissertação propõe-se a inventariar o “estado da arte” dos Sistemas para a Transposição de Peixes, isto é, conhecer as necessidades dos nossos peixes, estudar alternativas hidráulico-estruturais de transposição e, também, vencer as correntes retrógradas.

Os estudos e projetos internacionais não devem ser aplicados indiscriminadamente para a realidade nacional, pois diferem quanto à diversidade dos nossos peixes, sob a pena de incorrer nos insucessos como os australianos africanos e os brasileiros.

Na dissertação, após à introdução, há um breve relato sobre a importância entre as relações ecológicas e ambientais; relações entre os elementos vivos e o meio aquático e as interferências humanas; conhecimentos físicos e biológicos sobre os peixes; história, conceitos fundamentais e legislação sobre os STP’s; estudos para viabilização de estruturas-tipo em modelo reduzido e estudos futuros.

Neste Boletim apresenta-se, de forma sucinta, uma introdução, o estudo experimental para tipos de soleiras de STP’s tipo escada e as conclusões e recomendações.


1. Introdução

O Brasil, com extensão territorial superior a 8 milhões de km2, privilegiado em recursos hídricos com cerca de 20% da água doce mundial e a maior das bacias hidrográficas: Amazônica, mundialmente reconhecido pela importante biodiversidade, possui mais de 3.000 espécies de peixes, conforme McAllister et alii (ap. Godinho et alii, 2000, Ref. [16]), ou seja, aproximadamente 2/3 do total do universo global existente (Fishing Guide, 1996, Ref. [13]), muitas das quais, cerca de 20% (Themag, 1999, migram e não recebem a atenção merecida quanto à preservação e manutenção, apesar dos compromissos internacionais firmados na ECO-92, 1992, onde se declarou ao mundo que cada ser vivo, planta ou animal, não são apenas bens locais, mas um patrimônio da humanidade e assim devem ser tratados.

Os peixes vivem, em todo o mundo, em função de dois comportamentos básicos:

a) Conservação da Vida: os peixes agem e reagem ao meio ambiente, procurando locais favoráveis quanto à alimentação, à temperatura e às condições físico-química/biológicas; assim, realizam migrações tróficas descendentes;

b) Geração:
anualmente os peixes de piracema migram contra as correntezas para se cansarem, no sentido fisiológico e bioquímico, para a reprodução (Godoy, 1992. Larinier, em 1999, definiu um STP como sendo um dispositivo para atrair e conduzir seguramente a migração de peixes: trófica e reprodutiva, aos seus ambientes.

Morishita, em 1995, sugere a ampliação da dimensão simplista de concepção de um STP como sendo apenas uma passagem para peixes migradores, pois assim se excluí outros importantes organismos que também utilizam este sistema.

Recomenda que o termo adequado seja biopassagem (“biopath”) definido como estrutura artificial em águas continentais na qual os organismos utilizam para migração reprodutiva, trófica ou simplesmente deslocamento, incorporando a filosofia de biodiversidade.

A Transposição de Peixes, no exterior, principalmente no hemisfério norte e Japão, é um tema consolidado há séculos (Odeh, 1999, incorporado aos empreendimentos fluviais e marítimos, com aplicação incontestável entre o meio técnico e leigo, amparados por legislações efetivas específicas.

“No Brasil, apesar das características hidrográficas favoráveis, dos grandes cardumes de peixes migradores, da importância geral dos peixes e da pesca, o assunto escadas de peixes, na verdade, não existe...” (Godoy, 1998,).

No barramento das águas, para qualquer finalidade: energético, abastecimento, contenção, irrigação, turismo, lazer, que não contempla mecanismos apropriados para trânsito de peixes, condena os migradores à extinção pela ausência de reprodução com todas as consequências sobre o ambiente e o homem.

Os Sistemas para a Transposição de Peixes associa-se, inevitavelmente, as hidroelétricas que produzem, aproximadamente, mais de 95% da energia nacional, constituindo-se, porém, num dos seus principais obstáculos físico, legal e cultural.

continua...
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Alexandre Estanislau (Zeca)
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Mensagem por Alexandre Estanislau (Zeca) » Sáb Jun 28, 2008 11:44 am

Vou colocar os links aqui

PARTE II - viewtopic.php?t=27189&highlight=

PARTE III - viewtopic.php?t=27191&highlight=
UMPA - Um P*** abraço

Alexandre Estanislau (Zeca)
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jckruel
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Obrigado Zeca

Mensagem por jckruel » Sáb Jun 28, 2008 11:50 am

Grande Zeca,

Obrigado! Fica mais fácil para ler tudo (rs)

Na verdade foi minha intenção deixar em algum lugar (e aqui é o nosso cantinho) subsídios importantes dos "pró" mecanismos, caso alguém se prontifique (um dia) a continuar a minha luta na defesa da biodiversidade dos peixes.

abração

Kruel
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Silvio Araujo Neto
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Mensagem por Silvio Araujo Neto » Seg Out 19, 2009 8:33 pm

Parabéns pela luta.... ....e a fila anda.
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